Um olhar pela jurisdição do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco

 

Um olhar pela jurisdição do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco

Desde a revisão constitucional de 1989 que os tribunais administrativos constituem uma categoria própria de tribunais1, distinta dos tribunais judiciais, cujo órgão superior se trata do Supremo Tribunal Administrativo (212º/1 CRP). Conjugado com este artigo é passível ainda de referência o artigo 1º do Estatuto dos Tribunais Administrativos Fiscais (doravante ETAF), que é uma reafirmação da cláusula geral do artigo 212º/3, e que atribui competência aos tribunais administrativos para dirimir litígios provenientes de “relações jurídicas administrativas e fiscais”. Por sua vez, o artigo 4º do ETAF concretiza a cláusula geral, enumerando as matérias que expandem ou comprimem o âmbito jurisdicional da justiça administrativa.

O ETAF distingue ainda duas importantes categorias de tribunais, ao nível da primeira instância – os tribunais administrativos de círculo e os tribunais tributários- , cuja sede e respetivas áreas de jurisdição são determinadas por decreto-lei (artigos 39º e 45º ETAF).  O artigo 3º do Decreto lei 325/2003 referente à “Sede, Organização e Área de Jurisdição dos Tribunais Administrativos” enumera como sede dos tribunais, nomeadamente, Almada, Beja, Braga, Castelo Branco, Coimbra, Funchal, Leiria, Lisboa, Loures, Mirandela, Penafiel, Ponta Delgada, Porto, Sintra e Viseu, cuja área de jurisdição consta do mapa anexo.

Em conjugação com os Tribunais de primeira instância, é de referir os Tribunais Centrais Administrativos que funcionam como tribunal de recurso de 2º instância, não obstante possuírem também competências de primeira instância referidas no artigo 37º alíneas c) e d) do ETAF, ou conferidas por lei avulsa (artigo 6º da Lei 34/2007 de 13 de Janeiro). Como órgão superior da hierarquia temos o Supremo Tribunal Administrativo, com sede em Lisboa e jurisdição em todo o território nacional (artigo 11º ETAF).

Existem duas regras de organização destes tribunais, desde logo a existência de um duplo grau de jurisdição e, excecionalmente, de um triplo grau (24º/2 ETAF e 150º CPTA)2 ,sendo tal regime incorporado no domínio da justiça administrativa o que leva a que cada litígio, independentemente da instância em que começa, seja suscetível de recurso, tendo como principal objetivo o de assegurar a intervenção de um tribunal de hierarquia superior. Aliada a esta caraterística, o facto ainda de os tribunais administrativas terem alçada, fixada em função da atribuída aos tribunais judiciais (6º ETAF).

Depois desta exposição mais teórica do tema em questão, e focando agora mais especificamente na matéria pretendida, a área de jurisdição do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco assume-se como um dos tribunais que detém maior abrangência territorial, tendo jurisdição nos distritos de Castelo Branco, Guarda e Portalegre. Pelo volume de processos a cargo deste Tribunal, conjugado com uma lógica de distribuição que seja mais equilibrada, foi publicado o Decreto-Lei nº 58/2020 de 13 de agosto que procede à alteração das áreas de jurisdição dos Tribunais Administrativos e Fiscais de Castelo Branco e Viseu, respetivamente.

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu passou a integrar diversos Municípios outrora pertencentes à área de jurisdição de Castelo Branco, por se encontrarem os mesmos com uma localização geográfica mais benéfica a favor de Viseu. Com esta reorganização, apenas os Municípios do Sabugal e de Manteigas, pertencentes ao distrito da Guarda, continuam a pertencer à área de jurisdição do Tribunal Administrativo de Castelo Branco.

A reorganização proposta segue a linha adotada para a reforma efetuada ao ETAF e ao CPTA, cujas alterações visaram a agilização dos processos e modernização das estruturas de modo a aumentar a celeridade do Tribunal, dado o elevado número de processos que se assiste nos tribunais administrativos e fiscais. Foi ainda proposta a criação de um Tribunal Administrativo e Fiscal no distrito da Guarda de modo a julgar litígios naquele âmbito territorial e também para conseguir responder às necessidades dos cidadãos, contudo o mesmo está a ser ainda alvo de discussão, sendo que um dos argumentos usados para a necessidade de criação deste Tribunal conjuga-se com o número de processos por parte do distrito da Guarda que dão entrada nos Tribunais de Castelo Branco, e que levam a períodos longos de decisão que não são, de todo, compatíveis com o direito de “obter, em prazo razoável, e mediante um processo equitativo, uma decisão judicial..”3

Esta reestruturação, que terá efeitos notáveis no âmbito do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, por aumentar o volume de processos que passam a ser dirigidos a este mesmo Tribunal, cria por sua vez a necessidade de um reforço de recursos humanos de modo a conseguir fazer face a esta nova realidade, para que não ocorra a sobrecarga de todos os oficiais de justiça atualmente colocados, sob pena de contrariar todo o propósito que tal alteração propunha trazer. Uma das críticas, apontadas inclusive pelo professor Vasco Pereira da Silva, relativamente à revisão do Processo Administrativo de 2019, indigita para o facto de continuar a não existir, no ETAF, qualquer “referência à formação especializada nem à carreira autónoma dos juízes de jurisdição administrativa, pelo que se mantêm o atual status quo”4, o que se conjuga com o atual problema aqui igualmente exposto referente à falta de recursos dos Tribunais administrativos para conseguir responder a todos os processos em curso, que demonstra os efeitos da morosidade e falta de eficiência dos tribunais Administrativos.

                                                                                                                            

                                                                                                               Ana Isabel Brás Almeida

                                                                                                                                    Nº 58323

                                                                                                                                  Subturma 5


1-  Vasco Pereira da Silva , “O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise” Páginas 199-200

2- José Carlos Vieira de Andrade, “A Justiça Administrativa”

3- Artigo 2º do CPTA (Código do Processo nos Tribunais Administrativos)

4- “Revisitando a reforminha do Processo Administrativo de 2019 – “Do útil, do Supérfluo e do Erróneo” publicado em https://e-publica.pt/volumes/v6n3a02.html









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