A Tramitação Processual na Ação Administrativa - O Processo Eletrónico
O processo nos tribunais administrativos é,
desde a revisão de 2019, um processo eletrónico, nos termos do artigo 24º/1
CPTA, por contraposição ao anterior que, sob a epígrafe “Realização de atos
processuais” estabelecia apenas uma preferência pela tramitação eletrónica.
De facto, o legislador
optou, desde 2019, por abandonar esta mera preferência, e prescreve agora a
adoção, total e efetiva, de uma tramitação processual eletrónica, salvo nas
situações previstas no nº 5 do mesmo artigo (quando se trate de causa que não
importe a constituição de mandatário e a parte não esteja patrocinada) e no nº
6 (quando por justo impedimento, não seja possível aos representantes das
partes praticar algum ato por via eletrónica).
Uma vez que, sobre o tema
que abordamos, inúmeras considerações merecem ser feitas, e o espaço para a
exposição das mesmas é curto, vejamos os aspetos que consideramos fundamentais
para a análise da nova tramitação processual administrativa.
Desde logo, naturalmente, temos como
primeiro articulado a considerar, a petição inicial.
Os requisitos da petição
inicial encontram-se previstos no artigo 78º CPTA, surgindo logo aí uma
questão: como conjugar o nº 1 deste artigo, com o regime da tramitação
eletrónica previsto no art. 24º?
Pois bem, parece desde
logo que a redação do art. 78º não acompanhou aquela do art. 24º, uma vez que
aquele parece considerar ainda que a regra é a da receção física da petição
inicial.
Mais, no nº 2 do mesmo
preceito, o legislador parece forçar uma duplicidade dos elementos, já
previamente inseridos no formulário disponibilizado pelo sistema informático de
suporte à atividade dos tribunais administrativos, dando assim a entender que
existe uma discrepância entre a nova tramitação processual administrativa e
algumas disposições do CPTA, que não acompanharam a referida mudança.
O mesmo se diga do artigo 80º CPTA, que tem
neste momento uma epígrafe (“Recusa da petição pela secretaria”) manifestamente
desfasada, uma vez que a recusa, maxime, a comprovação, é hoje, em
regra, efetuada pelo sistema informático de suporte à atividade dos tribunais
administrativos. Sufragamos assim, quanto ao artigo 80º/3, que o melhor
entendimento é aquele do Prof. Tiago Serrão.
Discordamos ainda igualmente
do entendimento de João Tiago Silveira e vamos mais longe, nos termos em que,
atendendo à posição do mesmo, a secção de processos da secretaria teria ainda
de fazer uma dupla verificação dos factos que possam levar à recusa da petição
inicial o que, como se compreende, esvaziaria de qualquer efeito útil o sistema
informático de suporte nesta matéria.
Mais uma vez, no art. 78º/4,
o legislador parece abstrair-se por completo do art. 24º, já que prescreve que
o rol de testemunhas conste da petição inicial, parecendo esquecer-se que o
referido formulário já tem que obrigatoriamente conter esses elementos.
Embora as situações
referidas possam ser as mais flagrantes, muitas mais incongruências poderiam
ser referidas, nomeadamente quanto à citação (art. 81º CPTA), contestação
(83º), envio do processo administrativo (84º), entre outras.
Também há, indubitavelmente, uma palavra a
dizer a propósito do regime eletrónico nas notificações e nas decisões finais,
embora, para as notas que queremos deixar claras, nestas, com menos relevância
do que nos articulados. De forma geral, a verdade é que nestes três aspetos, o
legislador parece preterir de forma grosseira a tramitação eletrónica agora em
vigor, de resto, como já fazia por vezes quando esta era uma mera preferência
não vinculativa.
Se o novo paradigma da tramitação administrativa
é eletrónico, não deveria o legislador acompanhar essa verdadeira revolução ao
longo das disposições do código? A resposta é, na nossa opinião, irrefutavelmente
afirmativa. Aliás, acreditamos que impende sobre o legislador, um verdadeiro
ónus de modernização e implementação de uma justiça mais informatizada, logo
mais acessível, direta, e consequentemente, mais célere.
A modernização e
informatização adquirem aqui um significado especial e essencialidade, na
medida em que aproximar-nos-ão da ideia programática, quase utópica, do célere
andamento da justiça, bem diferente daquela a que estamos habituados.
A verdade é que tal não aconteceu com a
reforma de 2019. Alterou-se, como já vimos, o preceito do art. 24º, sem o
devido acompanhamento ao longo do código das diversas disposições que com
aquele se relacionam. O que urge alterar no Código de Processo nos Tribunais
Administrativos são precisamente as referidas disposições do mesmo, e outras,
que, na sua atual redação, não se coadunam, aliás são por vezes antagónicas, com
o novo paradigma da tramitação administrativa – o Processo Eletrónico.
Se o CPTA tem por vezes sido posto em causa
quanto à técnica legislativa nele utilizada, e discrepâncias legais e
incongruências materiais (no sentido processual) como estas, não o salvarão da
má fama que por vezes lhe é reconhecida. É mister a adequação normativa do CPTA
à nova tramitação processual administrativa, sob pena de estarmos perante normas
que se contrariam entre si. Mais, estes antagonismos legislativos revelam uma
verdadeira desconsideração pela segurança jurídica e unidade normativa que se
esperam numa codificação, podendo eventualmente gerar verdadeiros problemas de
hermenêutica e aplicação do direito.
Pedro Novais Marques
aluno 27886 Subturma 5 4 Ano
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