Análise ao Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 7 de dezembro de 2018

 

Análise ao Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 7 de dezembro de 2018

Processo: 02652/15.8BEBRG

Data: 7 de dezembro de 2018

Tribunal: Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga

Relator: Frederico Macedo Branco

 

 

Aluna: Beatriz Ferreira

Nº: 58447

Resumo

 

Primeiramente, cabe-me fazer um breve resumo do conteúdo descrito no Acórdão a ser analisado. Ora, o VSRF, autor, vem recorrer da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga e intenta uma ação contra o Instituto da Segurança Social IP, réu, com o objetivo de impugnar o ato que determinou a devolução das prestações de Desemprego que tinha recebido.

 

 

.Decisão do TAF de Braga

 

Antes de mais, vale explicar qual a decisão do TAF de Braga. A questão trata da atribuição do subsídio de desemprego e, consequentemente, da decisão do réu que recusa a atribuição do mesmo. Pois bem, o TAF declarou a caducidade do direito de ação e absolveu o réu do pedido. Tal deu-se devido ao facto de o autor apresentar ação de impugnação no dia 6 de julho de 2015 e o direito dessa ação ter caducado em data anterior, a 5 de setembro de 2014. Para além disso, o réu considerou que já havia tomado a decisão a 16 de dezembro de 2013 e, após a mesma, não havendo notificação do autor daquela decisão, verificar-se-ia nulidade de todo o processo a partir dessa mesma data. O problema consistiu no facto de o TAF não se pronunciar acerca desta questão, ou seja, houve uma omissão de decisão quanto á nulidade de todo o processo administrativo.

É, no entanto, necessário indicar que caso não seja reconhecida a nulidade invocada, deveriam ser reconhecidos ao autor, o direito de impugnar dentro do prazo e, por conseguinte, a revogação, por esta razão, da decisão constante do despacho saneador (reconhecimento da caducidade do direito do autor de impugnar a decisão da ré relativamente ao subsídio de desemprego).

 

 

.Decisão do Tribunal Central Administrativo Norte

 

.Fundamentação de Facto

 

Antes de qualquer outro avanço, é crucial referir que à data do despacho recorrido, foi aplicada a Lei 63/2011 de 14 de dezembro, ou seja a 5a versão do CPTA. Isto faz com que os números dos artigos daqui para a frente referidos não são os mesmos dos que se encontram no CPTA atualizado.

Ora, o art. 87º do CPTA (Lei 63/2011) refere que o processo é concluso findos os articulados e quando o juiz deva conhecer obrigatoriamente de todas as questões que obstem ao conhecimento do objeto do processo, sendo uma dessas questões, a caducidade do direito de ação (art. 89º, nº1, h)). Por outras palavras, a caducidade do direito da ação é uma exceção dilatória de conhecimento oficioso que impede o prosseguimento da ação e por isso, não permite proferir despacho de aperfeiçoamento (art. 88º CPTA). Segundo o art. 58º, nº2, b) do CPTA, o prazo de impugnação de atos administrativos anuláveis é de três meses. Tal prazo de três meses começa a correr a partir do momento em que se efetua a notificação dos interessados, isto é, a partir do momento em que estes têm conhecimento oportuno dos atos que são suscetíveis de afetarem a sua esfera jurídica (art.59º nº 1 do CPTA). Considerou-se, para além da contagem destes 3 meses, o facto de este prazo ser contínuo e de suspender nas férias judiciais (art. 144º, CPC). Mesmo assim, verificou-se por fim que, tendo o autor sido notificado no dia 14 de fevereiro de 2014 e a presente ação dado entrada no TAF de Braga no dia 6 de julho de 2015, o prazo já se encontrava ultrapassado.

 

 

.Fundamentação de Direito

 

Como referido anteriormente, o art. 58º, nº2, b) do CPTA prevê o prazo de 3 meses para a impugnação de atos anuláveis. Complementarmente, citando o Acórdão do TCAN nº 00298/10.6BEMDL de 18 de dezembro de 2015: “Resulta do artigo 58º, nº2 do CPTA que os atos administrativos que enfermam de mera anulabilidade podem ser impugnados, em regra, no prazo de três meses, a contar da data da notificação do ato a impugnar; A contagem do prazo de três meses, estabelecido no art. 58º, nº2, b) do CPTA para a impugnação de atos administrativos, quando esse prazo abranja período correspondente a férias judiciais é contínuo, mas suspende-se durante as férias judiciais; Assim, quando o prazo abranja período em que decorram férias judiciais, deve o referido prazo de três meses ser convertido em 90 dias, para efeito da suspensão imposta pelo artigo 138º, nº 1 e 4 do CPC, aplicável por força do artigo 58º, nº 3, do CPTA”. Para além disso, é também do entendimento do Professor Mário Aroso e Carlos Cadilha que a suspensão do prazo nas férias judiciais deve poder transformar os 3 meses referidos anteriormente no prazo de 90 dias, com o objetivo de serem descontados os dias de férias que estejam abrangidos pelo mesmo prazo.

Concluindo, o que de facto se releva aqui é referir que não é pelo facto de se recorrer a um tribunal hierarquicamente superior que o prazo para impugnar uma ação se reinicia (arts. 59º, nº4 do CPTA e 175º, nº1, CPA). Isto acontece porque, tratando-se de um recurso hierárquico facultativo, a contagem do prazo já se havia reiniciado a partir do dia seguinte ao do termo do prazo para que a administração se pronunciasse relativamente ao recurso hierárquico facultativo, sendo também descontadas as férias judiciais. Esta questão encontra-se referida no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 27 de fevereiro de 2008, Processo nº 848/06. Citando-o brevemente: “nos termos previstos no art. 59, nº4 do CPTA, a suspensão do prazo de impugnação contenciosa cessa com a notificação da decisão proferida sobre a impugnação administrativa ou com o decurso do prazo legal para a decidir, conforme o facto que ocorrer em primeiro lugar.”
Em conclusão, quando foi apresentada a presente ação a este tribunal, o prazo da propositura da impugnação da ação do réu já tinha acabado, não alterando qualquer resposta por parte do Tribunal Central Administrativo Norte. Assim sendo, verifica-se a exceção dilatória da caducidade do direito da ação.

O Tribunal Central Administrativo Norte decidiu negar provimento ao recurso, mantendo-se a sentença do TAF de Braga- declarou caducidade do direito de ação e absolveu o réu do pedido. Em suma, não se verifica a impugnação do ato que determinou a devolução das prestações de desemprego.

 

 

Matéria

 

Relativamente ao acórdão analisado anteriormente, vou incidir mais na matéria de impugnação de atos e respetivos prazos. Antes de mais, há que distinguir a declaração de inexistência de um ato administrativo da impugnação de um ato administrativo. De acordo com o art. 50º, nº1 do CPTA (versão atualizada), a impugnação de atos administrativos tem por objeto a anulação ou a declaração de nulidade desses atos. Por outro lado, a declaração de inexistência de um ato administrativo não é objeto de uma impugnação, é apenas uma declaração.

Porém, antes de aprofundar mais o conceito de impugnação dos atos administrativos, devemos saber o que são estes últimos. Ora, este conceito resulta dos arts. 51º, nº1, parte final do CPTA e 148º do CPA, que definem os atos administrativos como “todas as decisões que, no exercício de poderes jurídico-administrativos, visem produzir efeitos jurídicos externos, numa situação individual e concreta”. É relevante saber que tanto a Administração Pública, como as autoridades que não a integram e as entidades privadas que atuam no exercício do poder administrativo e que prosseguem interesses públicos, são entidades que praticam tais atos. O caso em específico tratava de um ato administrativo que incidia na devolução das prestações de Desemprego. Tratava-se de um ato administrativo, pois detinha conteúdo decisório, ou seja, não se tratava de um parecer não vinculativo; produziu efeitos externos, isto é, acabou por afetar os direitos e interesses de uma entidade exterior àquela que praticou o ato e o mesmo foi praticado por um Instituto Público- Segurança Social- no exercício das suas funções jurídico-administrativas. Cabe também referir que a impugnabilidade dos atos administrativos não depende de forma (art. 52º do CPTA e 268º, nº4, CRP). Isto é, um ato pode ser formalmente legislativo, mas materialmente administrativo e tal não influencia a impugnabilidade do mesmo. Um exemplo desta situação é haver um Decreto-lei que contenha uma decisão materialmente administrativa.

Além do conceito de ato administrativo e de saber que a sua impugnabilidade não depende da entidade que o pratique nem da forma sob o qual é praticado, importa saber que os atos impugnáveis são todos os atos administrativos que sejam suscetíveis de provocar uma lesão ou de afetar imediatamente posições subjetivas de particulares. Há, de facto, no caso a afetação de uma posição jurídica. Há, no próprio conceito de ato administrativo o preenchimento da impugnabilidade.

Já em relação ao ónus da impugnação, quem o detém é o destinatário do ato administrativo, neste caso, o VSRF. A constituição do ónus depende do preenchimento dos requisitos de oponibilidade presentes no art. 59º, nº1, 2 e 3: se o ato a impugnar já for eficaz; se destinatários foram notificados.

Relativamente aos prazos, o nosso art. 58º, nº1, CPTA, refere que o pedido de impugnação de atos nulos não está sujeito a prazo, mas a impugnação fundada na anulabilidade dos atos, se promovida pelo Ministério Público, tem o prazo de 1 ano e nos restantes casos, de 3 meses. Ora, o caso em apresso cabe na alínea b) do 58º, nº1.

Já o art. 59º, nº2, refere que o prazo inicia-se a partir da data de notificação.

 

Bibliografia

.CPTA 2011

.CPTA 2015

.CPA

.Ac. do TCAN nº 00298/10.6BEMDL de 18 de dezembro de 2015

. AROSO DE ALMEIDA, Mário- Manual de Processo Administrativo

 

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