Do modelo dualista à unificação das formas de processo principais não urgentes com a reforma de 2015
Com a revisão do CPTA operada pelo DL. n.º 214-G/2015, de 2 de outubro foi eliminada a matriz dualista das formas de processo, passando atualmente a existir uma única essencial forma de processo, a ação administrativa, que incorpora as pretensões a que anteriormente correspondiam as formas da ação administrativa comum e da ação administrativa especial (isto sem prejuízo das demais formas de processo especiais urgentes previstas), o que resulta da revogação do nº 2 do artigo 35º e do artigo 42º CPTA e de todas as alterações efetuadas aos anteriores Títulos II e III do código.
O CPTA na sua
versão original, estabelecia, assim, duas formas de processos principais não
urgentes: a ação administrativa comum (arts. 37.º e segs.) e a ação
administrativa especial (arts. 46.º e segs.).
Nos termos do
artigo 37.º/1 do CPTA, na sua redação original, seguiam a forma da ação
administrativa comum “…os processos que tenham por objeto litígios cuja
apreciação se inscreva no âmbito da jurisdição administrativa e que, nem neste
código nem em legislação avulsa sejam objeto de regulação especial”. Já o n.º 2
daquele artigo 37º do CPTA enumerava as pretensões que deveriam obedecer à
forma de Ação Administrativa Comum.
Segundo o
disposto no artigo 46.º/1 e 2 do CPTA seguiam a forma da ação administrativa
especial “…os processos cujo objeto sejam pretensões emergentes da prática ou
omissão ilegal de atos administrativos, bem como de normas que tenham ou
devessem ter sido emitidas ao abrigo de disposições de direito administrativo”,
dispondo o n.º 2 deste artigo 46º as pretensões que deveriam obedecer à forma
de Ação Administrativa Especial.
A distinção
entre os campos de aplicação destas duas formas processuais fazia-se da
seguinte forma: se a pretensão do particular se dirigisse contra um ato
administrativo de efeitos positivos ou uma norma administrativa, ou se visasse
a prática de um ato administrativo devido ou a edição de uma norma ilegalmente
omitida, a forma processual própria era a ação administrativa especial;
apresentando a pretensão do particular qualquer outra configuração, o processo
seguiria, em princípio, a via da ação administrativa comum[1].
Tal distinção, nas palavras do Professor Vasco Pereira da Silva[2],
não era justificada por razões de natureza processual, mas sim, por razões de
ordem substantiva temperadas com um condicionalismo histórico, graças à
“infância difícil” do Direito Administrativo. O modelo dualista adotado
assentava na contraposição, no plano substantivo, entre pretensões que se
reportavam e pretensões que não se reportavam ao exercício de poderes de
autoridade, consubstanciado na emissão ou omissão de atos administrativos e
normas regulamentares[3].
Dentre os
problemas suscitados por este modelo dualista, destaca-se a consunção da ação
administrativa comum pela ação administrativa especial em caso de cumulação
(ex-artigo 5.º do CPTA). Uma vez que, quando os pedidos cumulados
correspondessem a formas de processo diferentes, o antigo artigo 5.º do CPTA
determinava que se adotasse a forma da ação administrativa especial, daí
resultava que «a acção administrativa “especial vai passar a ser a “comum” e a
dita acção “comum” vai passar a ser, na prática, a “especial”[4]»
Com a reforma de
2015, foi afastado o modelo dualista anterior e, por isso, todos os processos
que correspondiam às antigas ação administrativa comum e ação administrativa
especial passaram a ser sujeitos a uma única forma de processo – a simplesmente
designada, ação administrativa (art. 37.º do CPTA).
No entanto, como
sublinha o Professor Mário Aroso de Almeida[5],
não se deixou de fazer depender a dedução de pretensões relativas a atos
administrativos e regulamentos de pressupostos processuais específicos ou com
um regime próprio que não se aplica aos demais tipos de pretensões.
Apesar de
existirem expressões claras de um modelo unitário no artigo 35.º e na
consagração de uma tramitação única e global para todas as ações principais não
urgentes nos artigos 78.º e seguintes do CPTA, continuam a verificar-se
indícios de preocupações específicas com os pedidos relativos a atos e normas,
nomeadamente, sob o ponto de vista dos pressupostos processuais e condições de
ação, visto que, é notória a muito maior preocupação do CPTA na regulação de
ações sobre atos e sobre normas (arts 50.º e ss. do CPTA) e também sob o ponto
de vista da tramitação da ação, mantêm-se algumas regras só aplicáveis a pedidos
típicos da antiga ação administrativa especial (designadamente, arts. 81.º/3 e
6, 83.º/4 e 84.º).
Rodrigo
Agostinho
N.º de
aluno: 56902
[1] Acórdão
do Tribunal Central Administrativo Sul de 04/05/17, Processo n.º: 091558/12,
Relatora: Helena Canelas
[2] Vasco
Pereira da Silva, O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise, 2.ª
Edição, Almedina, 2009, pág. 246
[3] Mário
Aroso de Almeida, Manual de Processo Administrativo, 4.ª Edição, Almedina,
2020, pág. 75
[4] Vasco
Pereira da Silva, O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise, 2.ª
Edição, Almedina, 2009, pág. 249
[5] Mário
Aroso de Almeida, Manual de Processo Administrativo, 4.ª Edição, Almedina,
2020, pág. 76
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