HIPÓTESE PRÁTICA N.º 22
Para que alguém possa figurar como parte num processo tem de preencher todos os pressupostos processuais relativos às mesmas partes. Em abstracto analisa-se o pressuposto da legitimidade processual. A legitimidade activa está contemplada no art.º 9.º e a passiva no art.º 10.º. No caso, importa aferir quem está dotado de legitimidade passiva, ou seja, quem deve ser demandado como contraparte, no litígio que ora se analisa.
O art.º 10º/1, ao contrário
do art.º 9.º/ 1, desdobra-se em duas partes: na
primeira temos que a legitimidade passiva é da contraparte da relação material
controvertida, tal como configurada pelo autor (à semelhança do estabelecido
para o Processo Civil, e contemplado no art.º 30.º CPC). Este critério é comum
ao art.º 9.º/ 1, no entanto, a sua aplicabilidade é bastante residual, e os litígios
que caem nesta norma não são de todo os mais representativos em Contencioso
Administrativo. Na segunda parte temos um alargamento da legitimidade passiva:
prescinde-se do critério da pré-existência de uma relação jurídica entre as partes
na acção, podendo o sujeito ser demandado, se tiver interesses contrapostos aos
do autor.
No caso, a decisão administrativa de atribuição da nota de desempenho
coube ao Conselho Directivo do Instituto dos Registos e Notariado, I.P.. (de agora
em diante, IRN, I.P.). Ora, o IRN, I.P. é um Instituto Público, integrado na administração
indirecta do Estado, dotado de autonomia administrativa e personalidade jurídica
própria. É uma pessoa colectiva pública, perfeitamente destrinçada da pessoa do Estado. O Conselho Directivo é
um órgão do IRN, I.P.
Este caso parece enquadrar-se dentro dos trâmites da legitimidade passiva das entidades públicas, já que não é um caso de legitimidade passiva de particulares, nem de órgãos públicos. A putativa regra, no que toca à legitimidade passiva de entidades públicas, é a de que esta diz respeito à pessoa colectiva (in casu, o IRN, I.P.) e não a um órgão que dela faça parte, como é o Conselho Directivo (art.º 10.º /2). VASCO PEREIRA DA SILVA diz que isto é uma falsa regra, porque tem tantas excepções, que nem devia valer como regra. Não parece então verificar-se a excepção prevista no art.º 10.º /2: o litígio não tem que ver com acções ou omissões de nenhum órgão do Estado (i.e. Ministérios), ou Regiões autónomas (i.e. Secretarias Regionais).
VASCO PEREIRA DA SILVA defende que a Pessoa Colectiva Pública não está em condições de poder continuar a funcionar como único sujeito de imputação de condutas administrativas em razão da complexidade da organização administrativa e da natureza multifacetada das modernas relações administrativas multilaterais. Por exemplo, não faz sentido chamar a um litígio o Ministro das Finanças por acto administrativo de funcionário de uma “terrinha”. O mesmo autor diz ainda que a personalidade jurídica não importa muito, o que importa realmente é a capacidade de exercício, e essa cabe aos órgãos. Deve dar-se primazia ao exercício dos órgãos e essa é a boa regra do Contencioso Administrativo. Opto por seguir a doutrina do Professor Regente: não faz sentido, neste caso, chamar a juízo o próprio IRN, I.P., por causa de uma nota, alegadamente, mal atribuída a uma conservadora predial. Assim, e apesar da regra do art.º 10º /2, faz sentido que se chame o órgão a juízo, e não a pessoa colectiva pública, sendo esse órgão o Conselho Directivo.
Isabel Villa de Brito
N.º 58162
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