O Acordão do STA de 14 Julho de 2015 - Na perspetiva da Legitimidade e do Interesse Processual
Esta análise tem por base o acordão do STA, processo n. 0549/15, através do qual se julgou uma providencia cautelar destinada a travar o processo de subconcessão do Metro de Lisboa e da Carris, na perspetiva das oposições deduzidas quanto à falta de interesse processual e à ilegitimidade ativa e passiva.
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Importa primeiramente aludir à matéria de facto deste Acordão, sendo então de referir a Resolução do CM nº10/2015, que determinava o início do processo de abertura ao mercado da exploração dos serviços públicos de transportes prestados pelas empresas Carris de Ferro de Lisboa, S.A. e Metropolitano de Lisboa, E.P.E., através da subconcessão destes serviços, sendo que estas entidades deviam preparar e conduzir o procedimento do concurso publico destinado a subconcessão. A Ministra do Estado e das Finanças e o Ministro da Economia deviam subdelegar os poderes para proceder a atualização dos contratos de concessão de serviço público celebrados com a Carris e o ML. Nesse sentido foram publicados dois contratos um relativo a subconcessão do serviço de transporte por metropolitano na cidade de Grande Lisboa ao Metropolitano de Lisboa E.P.E, e um outro relativo a subconcessão do serviço de transporte público coletivo de passageiros de superfície na cidade Lisboa a Carris, S.A.
Foi então nesse seguimento que os requerentes apresentaram uma providencia cautelar.
Contudo esta análise é focada nas oposições deduzidas previamente quanto à falta de interesse processual dos requerentes, a ilegitimidade ativa dos requerentes, à ilegitimidade passiva da AMTL.
Quanto à falta de interesse processual dos requerentes (“A e outros”):
As requeridas Carris e Metropolitano de Lisboa alegam que a resolução do CM aqui em causa determina o inicio do processo de abertura ao mercado da exploração dos serviços públicos de transportes, e pelo que já se tendo iniciado o processo e lançamento do concurso público, já se tinham esgotado todos os efeitos da referida resolução, ocorrendo assim a falta de interesse em agir dos requerentes. As requeridas concluem pela impossibilidade de suspensão do concurso e inaplicabilidade do art. 129º do CPTA.
Primeiro, cumpre diferenciar a legitimidade do interesse em agir, uma vez que este consiste no facto de o direito do demandante estar carecido de tutela judicial. A doutrina dominante sustenta que o interesse em agir constitui um pressuposto processual, este exige a verificação objetiva de um interesse real e atual, isto é, da utilidade na procedência do pedido e constitui um pressuposto comum diretamente decorrente da ideia de economia processual.
O que se exige é que o interesse do impugnante seja direto, no sentido em que ele deve ser atual, e que o impugnante deve estar constituído numa situação de efetiva necessidade de tutela judiciária (art. 55º/1 a.). Devemos, por isso, concluir que o interesse em agir continua a ser pressuposto da ação quer a nível principal quer a nível cautelar. Neste caso específico, o interesse dos requerentes é perfeitamente útil, apesar de já se ter iniciado o processo e lançamento do concurso publico, pois não se esgotaram logo todos os efeitos da referida resolução, uma vez que não resulta dos autos que o concurso em causa tenha terminado nem que tenha sido celebrado quaisquer contratos. Pelo que não se pode concluir pela inexistência de interesse em agir desta parte, improcedendo a exceção deduzida.
Relativamente à ilegitimidade ativa dos requerentes:
Os requeridos invocaram a ilegitimidade ativa por não estar aqui em causa a defesa de valores e bens constitucionalmente protegidos que apoiem a instauração de qualquer ação popular. E concluem que o município de lisboa é o único ente legítimo para sindicar judicialmente a titularidade das concessões outorgadas. Neste âmbito importa qualificar a ação popular como um meio previsto no art. 52º/3 da CRP e dos arts. 1º/1 e 2 e 12º/1 da lei nº83/95 (“lei da Ação Popular”), e ainda no art. 9º/2 do CPTA. É de referir que a enumeração presente no nº2 deste artigo é meramente exemplificativa, devido ao art. 52º/3 da CRP dar uma cobertura constitucional ao direito da petição e de ação popular. Logo, a ação administrativa popular aplica-se a todas as espécies processuais que integrem o contencioso administrativo, nomeadamente a impugnação de atos administrativos e as respetivas providências cautelares defensoras dos interesses difusos, independentemente de qualquer lesão na esfera jurídica, património, nome ou dignidade, ou ainda benefícios diretos e imediatos que resultem da invalidação do ato administrativa e suspensão na esfera jurídica dos requerentes, estes possuem legitimidade. E nesse sentido os requerentes pretendem suspender a Resolução do CM no sentido de assegurar a utilidade da decisão principal que venha a ser proferida no âmbito da ação especial de impugnação daquele ato administrativo. Contudo, ainda neste âmbito, não podemos deixar de considerar a garantia constitucional da autonomia local, assim como a defesa do património do município como valores difusos.
O tribunal decidiu no sentido da ilegitimidade para invocar a violação da autonomia local por entender que era o município que detinha os referidos poderes de concessão, não podendo assim proceder. Mas por outro lado, relativamente a violação de preceitos constitucionais de legalidade e qualidade de vida dos habitantes de lisboa, independentemente de estar aqui em causa ou não o património do município ou do estado a subconcessão destes serviços e o alagamento das mesmas ao setor privado é matéria suscetível de atentar contra preceitos constitucionais. Tendo assim os requerentes em causa legitimidade ativa independentemente de qualquer lesão especifica na sua esfera jurídica, património, ou demonstração de benefícios diretos e imediatos que derivam da anulabilidade ou suspensão do ato, por estar em causa a defesa de “interesses difusos” gerais e unitários da comunidade quanto à regularidade de um concreto desempenho da Administração.
Ilegitimidade passiva da AMTL:
A autoridade metropolitana de transportes de lisboa invoca que é parte ilegítima neste processo cautelar. Como resulta do art. 114º\3 CPTA e do dl 232/2004, art. 2º, as AMT são pessoas coletivas publicas dotadas de autonomia administrativa, financeira e de património próprio, e são autoridades organizadoras de transportes e no âmbito dos sistemas de transportes urbanos e locais das áreas metropolitanas de Lisboa e do porto. Os requerentes invocaram a AMTL, nos termos do art. 10º/1 CPTA como “contrainteressada”, isto é, as pessoas ou entidades titulares de interesse contrapostos aos do autor, ainda aqueles a quem a adoção da providência possa diretamente prejudicar (art. 114º/3 CPTA). A ATML não é, pois, uma entidade diretamente prejudicada, pela adoção da providência cautelar requerida, pelo que não preenche o requisito previsto no art. 114º/3 d.) CPTA devendo ser absolvida da instância.
Conclusão:
→ Os juízes do STA julgaram procedente a exceção de ilegitimidade passiva da ATM, absolvendo-a da instância;
→ E julgaram improcedente a pretensão cautelar requerida e pedido de intimação, uma vez que apesar de se encontrarem preenchidos os pressupostos do art. 120º/1 b.) do CPTA (o fummus boni iuris, e o periculum in mora), o juiz pode recusar a concessão da providência cautelar quando o prejuízo resultante para o requerido se mostre superior ao prejuízo que se pretende obviar ou evitar com a providência, o que acontecia neste caso, uma vez que os danos para o interesse público que resultariam da suspensão do ato são superiores aos que poderiam resultar da sua recusa.
Bibliografia:
Viera de Andrade, "A Justiça Administrativa - Lições"
Mário Aroso de Almeida, "Manual de Processo Administrativo"
Ac. do STA de 14 Julho de 2015, proc. n. 0549/15
Carolina Porto da Silva, 4ª ano, Turma A, subturma 5
Nº de aluo: 59146
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